19/06/2007

QUADRILHA DE JUNHO

Por Gisele Pecchio Dias

Pula a fogueira Iaiá...
Pula a fogueira Ioió...
Cuidado para não se queimar...

Já foi o tempo em que falar em quadrilha, no mês de junho, era só brincar de Ioió e Iaiá, ao som da viola e da sanfona.
Lembro-me, com saudade, das festas de rua, das cadeiras na calçada, do cheiro bão de quentão e da pipoca na manteiga.
No céu, o colorido das bandeirolas e o brilho dos fogos de artifício.
No chão de terra vermelha, mãos inocentes arremessavam biribinhas, também conhecidas como estalos.
A chama da fogueira cozinhava o pinhão e iluminava a trilha aberta pelos pés de alpercatas.
O elenco da dança típica de junho era protagonizado por homem e mulher, na condição de noivos.
De quadrilha de junho eu entendo.
E como entendo...
E não poderia ser diferente.
Sou filha de pai nordestino, das Alagoas.
Nasci em plena noite de São João, tendo sido anunciado o meu nascimento por um balãozinho que caiu com a tocha acesa, no quintal de casa, dia 24 de junho, às 23 horas, exato instante em que vim ao mundo.
Não há filho nascido em terras nordestinas que não anseie passar férias na cidade natal, no mês de junho, em especial no vigésimo quarto dia, quando se festeja o Dia de São João, o ápice das comemorações juninas no nordeste brasileiro.
Mas, neste junho, falar de quadrilha não é só brincar de Ioió e Iaiá, ao som da viola e da sanfona.
Falar de quadrilha, em junho de 2007, é sentir cheiro de pizza, após ler e ouvir falar sobre um monte de notas frias de compra e venda de boi.
Era tanto boi que dava para fazer churrasco o mês de junho todo para alimentar a população das Alagoas, terra de papai e também dos Marechais.
Em julho, também haveria de ter carne de boi para alimentar o povo todo das Alagoas.
Boi pai d'égua.
Boi filho d'égua.
Boi arretado.
Boi danado esse boi.
Boiiii...
Daria para fazer um churrasco por dia, em agosto também.
E convidar os irmãos de Minas.
Êta trem bão sô!
Também a gurizada do Rio Grande.
Deu pra ti, baixo astral, vou pra Porto Alegre, tchau...
Jamais pensei que nas Alagoas de papai não somente abundava as mais variadas canas, centenas de tipos delas, para alimentar a sede do Brasil e dos usineiros.
Também tem boi em abundância por lá?
Ôxe...
Oh, xente!
Seo Renan é o maior pecuarista do Brasil.
Ele está contribuindo, também, para mudar o conceito das quadrilhas de junho.
E dos protagonistas das quadrilhas de junho, idem.
Homem e mulher não são só os noivinhos da alegre dança junina.
Homem e mulher tem mudado conceitos...
Depois de relaxar e gozar, cuidado para não se queimar.
Pula a fogueira Ioiô...
Pula a fogueira Iaiá...
Cuidado para não se queimar...

Foto: AP/Gisele Pecchio, com 7 anos, na festa junina do 2º Grupo Escolar de Osasco, atual Emef Prof. José Liberatti

14/06/2007

SERGIO AMARAL

"Tenho um monte de amigo e o cê, tia?", me perguntou a bela adolescente. "Meu orkut tá bombando", emendou orgulhosa diante da sua página na comunidade virtual orkut.
Sorri e lhe falei sobre companheiros de escola, trabalho e outras jornadas, mais conhecidos como colegas. Um colega pode chegar a ser amigo mas, ao longo de uma vida, poucos conseguem manter o seu lugar no pódio.
Colegas entram e saem das nossas vidas. Muitos desaparecem, nunca mais temos notícias deles.
Amigos entram em nossas vidas e ficam para sempre, mesmo que a vida nos afaste em diferentes e distantes caminhos. Mesmo sem notícias dos amigos, jamais os esquecemos. Estarão vivos em nossas lembranças, para sempre.
Felizes são os amigos que não se afastam, mesmo trilhando caminhos diferentes. Mesmo sem jamais se reencontrarem, além da lembrança e da boa palavra.
Feliz de mim que hoje recebi a boa palavra do querido poeta Sergio Amaral (ler post abaixo). Um colega de trabalho que virou amigo e me conquistou com a boa palavra, a elegância, os saberes.
Sergio me trouxe a lembrança de um tempo que já vai longe, quando trabalhei na gerência de Comunicação do Banco Francês e Brasileiro (hoje, Itaú Personnalité), com os inesquecíveis Lourival, Claudio Costa e Novaes. Deste trio, mantenho o contato com o amigo Claudio, até hoje. Nos falamos dia 11, quando liguei para cumprimentá-lo pelo aniversário. Uma das pessoas mais íntegras e leais que conheci. Tenho saudade do Novaes, que me confiava cheque em branco. Muito difícil alguém receber e dar crédito assim...
Eu cuidava da comunicação interna do banco e editava a revista Franjour, a menina dos olhos da nossa diretoria. Sergio era executivo da área de underwriting. Associado ao Crédit Lyonnais, o BFB mantinha a tradição francesa de incentivo à cultura e às artes. Por isso, foi muito fácil descobrir e revelar para todos o poeta e escritor Sergio Amaral, também crítico literário, lotado na área financeira do banco. Ele foi convidado e aceitou colaborar com a editoria de literatura da revista Franjour, chamada por nós de Estante. Um sucesso.
Trabalhar na Comunicação do BFB foi uma etapa muito importante da minha carreira. O ambiente social do banco era intenso e favorável ao desenvolvimento da amizade e do intercâmbio cultural entre Brasil e França. Cheguei a ser correspondente da Comunicação do Crédit Lyonnais na filial brasileira, enviando notícias do BFB e do Brasil para a revista irmã do Franjour, em Paris.
Sergio, que lembranças boas você me traz. Por isso, homenageio você e o BFB-Crédit Lyonnais publicando uma das capas da revista Franjour e a página da divulgação interna que fizemos para anunciar a sua estréia, na editoria de Literatura.
Merci, chéri ami Sergio.
Tu c'est bienvenue.
Bienvenue aussi dans Aimons des Livres Inclusifs.

SERGIO AMARAL é jornalista e economista pela USP. Poeta, contista e crítico de literatura brasileira dos jornais O Globo e Gazeta Mercantil. Ganhou vários prêmios literários, inclusive no Exterior. Autor do livro "Vida felina" (1982), merecedor de elogios de Pedro Nava, Nélida Piñon, Josué Montello e Artur da Távola. Participou de "Contos Premiados", livro editado em Portugal, com o conto "Passagens". Recebeu do poeta Carlos Drummond de Andrade o seguinte bilhete, em 1977, pela sua participação na coletânea Cara a Cara: "Li e senti uma consciência humana e atenta à realidade social de hoje. Isto é bom. Gosto de poetas inconformados e que levam esta inquietação para a sua poesia".









UM DEPOIMENTO SUSPEITO SOBRE ELA

Conheço a Gisele há vários anos e sei que além de ótima jornalista e grande amiga, ela é uma batalhadora incansável pelas causas em que acredita. Assim tem sido nos últimos tempos com seus livros da coleção Toby, que ela, inteligentemente e com sua aguda sensibilidade, colocou a serviço de uma causa maior, pela igualdade de oportunidades e contra todo preconceito. Afinal, Gi, ser diferente é normal ! Beijo grande e sucesso !

12/06/2007

Gisele Pecchio faz palestra em Guaratinguetá




LITERATURA INFANTIL E INCLUSÃO - Quem é Toby? A Coleção Toby foi apresentada para 400 crianças do ensino fundamental de Guaratinguetá (SP), por meio de palestra de Gisele Pecchio, autora dos livros que têm como protagonista o cachorrinho Toby. Uma promoção da Secretaria Municipal de Educação, com o apoio do Serviço de Água e Esgoto (SAAEG), cuja direção tem incentivado iniciativas voltadas à inclusão social de crianças e adultos, sob orientação da pedagoga Marta Nascimento, doutoranda em educação ambiental.
Vinte e dois cegos, entre adultos e crianças, muito alegres, chamaram a atenção da palestrante quando disseram ser aquela a primeira participação deles num evento literário. O entusiasmo dos deficientes visuais aumentou quando foram informados que a Secretaria de Educação de Guaratinguetá e o SAAEG haviam adquirido exempalres dos livros de Gisele Pecchio em tinta, braile e CD para ficar à disposição dos leitores das bibliotecas e das escolas do município.
A autora também realizou oficina de leitura para filhos de funcionários da Unesp, campus Guará, no auditório da biblioteca central da universidade, com a presença de 36 alunos da pré-escola e professores.
As imagens de Paulo Miranda são da reportagem de Glauber Arneiro, cedidas pela tevê local à pesquisadora Marta Nascimento, responsável pela coordenação das palestras e visitas de Gisele Pecchio na cidade de Guaratinguetá.

11/06/2007

REVISTA EXAME

Por Adriano Silva

“... Paulo Francis dizia que política é coisa de gentinha. Ele tinha razão. De alguma forma, o sistema democrático não é eficiente em colocar no poder os melhores entre nós. Num bando de chimpanzés, o macho mais apto assume a posição dominante. Num time de futebol, a camisa 10 costuma ir para o melhor jogador. E assim por diante. Só na política isso não acontece. No sistema de candidaturas e de votos, por algum motivo essa regra universal de ensejo aos melhores é transfigurada no seu reverso. E assim os eleitos para gerir os interesses da comunidade acabam sendo de modo geral os mediadores, os medíocres, quando não simplesmente aquilo que produzimos de pior — os bandidos que se locupletam, os incompetentes que não deram certo noutro lugar, os delinqüentes patológicos, etc. Os melhores entre nós despontam nas artes, na iniciativa privada, nas profissões liberais, nos esportes. Mesmo os melhores políticos não estão na política: estão escrevendo teses, negociando fusões, ministrando aulas, seguindo carreiras diplomáticas ou acadêmicas. É como se os processos eletivos, por mais justos, necessários e inevitáveis que sejam, promovessem uma espécie de seleção natural ao contrário — a sociedade separa o joio do trigo e fica com o joio.
É preciso dizer que isso não acontece somente no Brasil. Repare que o presidente dos Estados Unidos não se chama Jack Welch nem Steve Jobs. Alfred P. Sloan e Roberto Goizueta também passaram longe do governo daquele país em suas épocas. E estamos falando de quatro dos maiores administradores que já andaram sobre este planeta. Os presidentes americanos, ao contrário, são e têm sido no mais das vezes sujeitos obscuros: péssimos estudantes, filhos ineptos, maus maridos, gente que não sobreviveria uma semana numa empresa de ponta ou num ambiente acadêmico de alto nível. É de assustar que, mais tarde, eleitos, eles venham a influenciar, com suas canetadas, a vida daquelas mesmas empresas e instituições de ensino de alta performance em que nem sequer teriam condições de atuar.
Talvez seja isso que a turma chama por aí de crise de representatividade. Quase sempre, ao se eleger alguém para síndico, não é o condômino mais preparado, o sujeito mais bem-sucedido do prédio, que vai para a cadeira (Este, na verdade, nem aparece nas reuniões. Porque imagina que tem mais o que fazer do que resolver problemas coletivos, do que trabalhar para os outros. Os melhores costumam focar em si próprios). Da mesma forma, os alunos mais brilhantes não freqüentam o diretório acadêmico. Estão ocupados demais competindo pelas melhores posições na turma. Idem para os órgãos de classe, que em tese representam uma categoria mas dificilmente conseguem atrair os melhores talentos para a importante posição de falar por todos os outros. Rubem Braga e Nelson Rodrigues, por exemplo, dois dos maiores talentos que já passaram pela imprensa brasileira, nunca estiveram à frente do sindicato dos jornalistas. É provável que também julgassem que tinham mais o que fazer.
Não sei bem por que é assim. Mas é assim. Os melhores entre nós escapam aos mecanismos de escolha de representantes em ambientes democráticos. Talvez no centro desse paradoxo esteja o fato de que os melhores não se candidatam, quase nunca se oferecem para consertar com as próprias mãos o que vêm de errado em sua comunidade. Não têm paciência para isso. Não têm interesse em socializar suas competências. E o quinhão de poder que a representação oferece não consegue dissuadi-los dessa posição refratária. As cadeiras no governo, no corpo legislativo, na máquina do Estado acabam sobrando, em decorrência disso, para os menos capacitados. Ou para os mais mal-intencionados. Talvez esse desinteresse que os melhores nutrem pela carreira pública seja um fator essencial para entender a tal crise de representatividade...” Trecho do artigo publicado na revista Exame, em 3 de abril de 2002, assinado pelo jornalista Adriano Silva.
Nesse artigo, o autor nos convida a refletir sobre o perigo de brincar com fogo. E mais, para o perigo de estarmos todos nos enganando. Eleição serve para alguma coisa? Democracia é de fato o pior dos regimes, excetuando os demais?

PAULO FRANCIS (1930-1997) foi correspondente da Folha de S. Paulo nos EUA. É autor de livros de ensaios políticos e culturais como Opinião Pessoal, Certezas da Dúvida, Paulo Francis Nu e Cru e Nixon contra McGovern: as duas Américas. Cabeça de Papel é o seu primeiro romance.