Menos um vaga-lume: partiu Ariano Suassuna
No final da década de 70, a colega de escola Sonia Maria me abordou eufórica, no intervalo entre uma aula e outra, com uma papelada em suas mãos dramáticas. Era o “Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna (1927-2014). Queria de todo modo organizar um grupo de leitura e dramatização daquele texto teatral mais conhecido da obra de Suassuna, que morreu ontem.
No final da década de 70, a colega de escola Sonia Maria me abordou eufórica, no intervalo entre uma aula e outra, com uma papelada em suas mãos dramáticas. Era o “Auto da Compadecida”, de Ariano Suassuna (1927-2014). Queria de todo modo organizar um grupo de leitura e dramatização daquele texto teatral mais conhecido da obra de Suassuna, que morreu ontem.
Filha de alagoano que sou, acordei adolescente para a linguagem
e personagens nordestinos com o cordel, literatura de rimas, em linguagem oral,
acompanhada de instrumento de cordas, como o violão. Também se apresenta
impressa em folhetos simples, presos como roupas em varal de barbante nas
feiras ou locais de reuniões populares e grupos de ativistas.
Entre os personagens do “Auto da Compadecida” há um Jesus Cristo
de pele negra. Nada conservador para o ano de 1955, quando a obra foi lançada,
mesmo ano em que João Cabral de Melo Neto (1920-1999), outro grande expoente da
literatura brasileira, lançava “Morte e Vida Severina”. Também para a década de
70 chamava a atenção do grupo de leitura a visão de Suassuna sobre a imagem do
Cristo. Sonia Maria, a Soninha, não conseguiu agrupar os colegas por muito
tempo na defesa daquela peça teatral. Negros e nordestinos, uma combinação
sempre polêmica na eterna luta de classes.
Serei sempre grata a essa genial colega de escola por ter sido
apresentada à obra deste grande autor. Soninha prestou vestibular e foi uma das
primeiras classificadas do ano de 1977 na Escola de Arte Dramática da Faculdade
de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-EAD-USP) e também na
Faculdade de Física da USP. Desapareceu em 1978 e nunca mais soube dela. Uma
vaga-lume que brilhou, se esforçou muito, mas não conseguiu concluir a sua
missão. Nem mesmo ela conhecia a intensidade do seu brilho e inteligência.
Ficou a lembrança do sotaque carioca, a pele branca, contrastando com os longos
cabelos pretos, e o jeito hippie de ser.
Julho de 2014 ficará marcado pela perda de
craques em muitas áreas, entre eles Plínio Sampaio, João Ubaldo Ribeiro,
Rubem Alves e Ariano Suassuna. Perdas também para a humanidade, que assiste ao massacre de inocentes na eterna guerra entre Israel e o povo Palestino.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Agradeço pela sua presença. Abraço meu, Gisele